quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O renascimento da energia nuclear

por Eduardo Araia, para Idéias Green

Depois de ficar algum tempo em plano secundário, a energia nuclear volta a ser uma opção concreta em vários países, incluindo o Brasil. Só os Estados Unidos, líderes em número de usinas, estudam a construção de 19 novas plantas nos próximos anos

(foto: Caetité)

Quando se fala em energia nuclear, a memória das pessoas com mais de 40 anos repassa, quase automaticamente, palavras como "Chernobyl" e "Three Mile Island". Os desastres ocorridos nessas usinas - o de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986; o de Three Mile Island, nos Estados Unidos, sete anos antes - estão entre os principais argumentos dos críticos dessa forma de energia, como o físico brasileiro José Goldemberg, prêmio Planeta Azul (o Nobel do meio ambiente) de 2008. Por que investir nela, se um erro em seu funcionamento pode causar tantos estragos ambientais e humanos? E o que fazer com os perigosíssimos resíduos radiativos dessa atividade, cuja destinação até hoje é uma incógnita?

Mas a necessidade de ser autossuficiente em energia, a escassez de fontes para isso e a ameaça cada vez mais onipresente do aquecimento global (cujo combate envolve a adoção de tecnologias que não liberem gases-estufa na atmosfera) têm feito o mundo olhar com outros olhos para a energia nuclear. Ela, aliás, é defendida por um "verde" acima de qualquer suspeita: o cientista britânico James Lovelock, criador da Hipótese Gaia. De acordo com ele, atualmente não há outra alternativa "lógica" para a necessidade de substituir a energia oriunda de combustíveis fósseis além da nuclear.

Com isso, e apesar de todas as pressões contrárias (e do preço para lá de salgado), a energia nuclear destinada a fins pacíficos é - diversamente do que se observava há alguns anos - um negócio em expansão no mundo. Hoje em dia há cerca de 440 reatores em ação ao redor do planeta, localizados em 31 países e gerando aproximadamente 17% da produção global de eletricidade. Cerca de 50 reatores estão em construção, especialmente na China, na Coreia do Sul e na Rússia. A França, a Índia, a Finlândia e até o Brasil também estão erguendo novas plantas.

A França, aliás, tem demonstrado há um bom tempo confiar plenamente na energia nuclear: quase 77% de sua matriz energética se baseia nessa fonte, o percentual mais elevado do planeta. O país possui atualmente 58 usinas, o que lhe dá a vice-liderança mundial no número de plantas do gênero. O primeiro lugar nessa classificação é, disparado, dos EUA, com 104 - número que vai aumentar significativamente nos próximos anos, numa verdadeira "renascença nuclear" iniciada pelo governo de George W. Bush em 2007 e assimilada por Barack Obama.

A base tecnológica

Duas tecnologias aparentadas - reatores de água pressurizada e água fervente - têm convivido desde o início da era da energia nuclear. No reator de água pressurizada (tipo predominante nos EUA), a água superaquecida é bombeada sob alta pressão para o núcleo do reator, onde transfere sua energia térmica para um sistema a vapor secundário que gira uma turbina a fim de gerar eletricidade. No reator de água fervente, a água, injetada diretamente no núcleo, cria uma mistura de vapor d'água que gira a turbina.

A ânsia do governo Obama por tirar seu país da dependência do petróleo e trocá-lo por fontes energéticas mais limpas está por trás da abertura dos cofres para o setor nuclear. Só em fevereiro deste ano, a Casa Branca anunciou US$ 18,5 bilhões em créditos tributários para o setor, além de garantias de empréstimos para novos reatores. Um projeto de lei sobre o clima elevaria essas garantias para US$ 54 bilhões. Calcula-se que cada nova usina nuclear norteamericana custe entre US$ 10 bilhões e US$ 12 bilhões. (A propósito, a vida útil de cada usina do país é limitada a 60 anos.)

A nova fase de investimentos dos EUA em energia nuclear veio com tamanha intensidade - entre 2007 e 2009 houve 18 pedidos de construção de novas plantas - que encontrou os órgãos reguladores despreparados para a demanda.

Para cuidar dos novos pedidos de licenciamento, a Comissão Reguladora Nuclear (NRC, na sigla em inglês), que havia perdido pessoal em virtude da falta de trabalho, contratou cerca de mil funcionários, cuja falta de experiência já inquieta muita gente. No geral, os norte-americanos acompanham entre animados e apreensivos esse renascimento nuclear. Afinal, foi lá que falhas humanas e de equipamento levaram ao primeiro grande acidente nuclear da história (ver quadro abaixo). Lá também é o país do popularíssimo anti-herói da tevê Homer Simpson, ácido emblema do norteamericano médio. Funcionário de uma usina nuclear, ele exibe uma (des)qualificação profissional habitualmente satirizada nas tramas da série.

Para minimizar os riscos de problemas como ações desastradas de algum "Homer Simpson", os novos modelos de usinas são mais simples e, em caso de acidentes, dependem menos de intervenções humanas ou mecânicas. A NRC tem aumentado o controle regulador desses projetos, exigindo características de segurança adicionais ou alterações de engenharia para melhorar o fornecimento de água de resfriamento de emergência. Alguns projetos, por exemplo, investem na gravidade para suprir essa água, em vez de bombas passíveis de falhas. A meta é reduzir o risco de um acidente capaz de danificar os núcleos dos reatores para uma ocorrência a cada 10 milhões de anos. E, mesmo que isso acontecesse, o governo considera que ainda assim a radiação não escaparia, pois os reatores têm edifícios de contenção e sistemas específicos para impedir que ela seja liberada.

Vista assim, a história da expansão do maior parque nuclear mundial parece bem encaminhada. Mas há problemas, afirmam os críticos. As estruturas de contenção dos projetos de centrais nucleares, por exemplo, são reforçadas desde o 11 de Setembro de 2001, de modo a resistir ao impacto direto de um avião, mas um modelo que sete concessionárias pretendem adotar, da empresa Westinghouse, não suportaria um grande terremoto, avalia a NRC. A recomendação pós-Three Mile Island de que se seguissem no máximo dois esquemas-padrão para as usinas - uma forma de simplificar o licenciamento, a construção e a operação das novas centrais, com a vantagem adicional de reduzir custos - está sendo atropelada pelas concessionárias. Na ânsia de conquistar mais rapidamente os recursos oficiais, elas aumentaram o leque para cinco esquemas-padrão, desenvolvidos em projetos feitos sob medida, cada qual com suas particularidades e exigências. Isso significa muito mais trabalho para a NRC e gastos bem maiores de manutenção.

A indústria nuclear, representada pelo Nuclear Energy Institute, tem alegado que suas avaliações de risco na concepção das novas usinas, para medir a probabilidade de um acidente grave, têm resultado em números muito baixos. Mas, para Edwin Lyman - cientista sênior da Union of Concerned Scientists, que tem avaliado a segurança de reatores nos últimos 40 anos -, os riscos dos atuais projetos são muito baixos quando apenas os eventos internos (como incêndios ou quebras de tubulação) são considerados. No caso de eventos externos, como terremotos, as novas centrais não mostram nenhum ganho de segurança em relação às suas antecessoras.

Lyman lembra ainda que, como os reatores são novos, as concessionárias na verdade não possuem nenhuma experiência operacional com eles, o que torna as avaliações de risco mais um exercício teórico do que um estudo baseado em dados concretos. Mas o mais importante, segundo o cientista, é que o projeto original desses aparelhos lhes permite suportar apenas uma sequência previsível de eventos. Acontecimentos inesperados, como os observados em Three Mile Island, já causariam acidentes, alerta Lyman.

Energia nuclear, enfim, é um negócio que envolve riscos, e cabe aos investidores, aos governos (que em vários casos também estão no primeiro papel) e à sociedade avaliar se vale a pena correr esses riscos em função do provável retorno. Em países como o Brasil, a dúvida é considerável, dadas as alternativas disponíveis. Para quem não as tem, como França ou Japão, a opção pela energia nuclear é compreensível - e, uma vez adotada, não adianta muito reclamar das consequências. Como observou o químico japonês Yumi Akimoto, um dos formuladores da política energética de seu país, "se vamos aceitar o poder nuclear, temos de aceitar o sistema por completo. Algumas vezes queremos nos deliciar com a primeira colheita de frutas, mas esquecemos como cultivar as árvores".

Ícones do desastre nuclear

(foto: Mark Resnicoff)

Chernobyl - Construída em Pripyat, na Ucrânia (então parte da União Soviética), a usina de Chernobyl foi palco, em 26 de abril de 1986, do pior acidente nuclear da história: uma explosão de vapor em seu reator 4, seguida de incêndio, novas explosões e, por fim, um derretimento nuclear. A nuvem de radiatividade resultante atingiu a União Soviética, a Europa Oriental, a Escandinávia e o Reino Unido. A contaminação, 400 vezes maior do que a registrada em Hiroshima após a explosão da bomba atômica, em 1945, levou à evacuação e ao reassentamento de populações de grandes áreas da Ucrânia, da Rússia e de Belarus (país no qual caiu cerca de 60% da radiatividade). Um relatório da ONU de 2005, contestado por ambientalistas, informou que o acidente causou 56 mortes até aquela data e originou doenças que matariam mais 4 mil pessoas. Defeitos no projeto do reator e falhas humanas são as prováveis causas do acidente.

(foto": Wikimedia Commons)

Three Mile Island - Situada na Pensilvânia (EUA), a usina de Three Mile Island registrou em 28 de março de 1979 o até então maior acidente nuclear do mundo. A soma de erros humanos e de projeto levou a central a sofrer uma fusão parcial, com vazamento de radiatividade para a atmosfera. Em poucos dias, cerca de 140 mil pessoas deixaram voluntariamente a área num raio de oito quilômetros a partir da usina. Esse acidente nuclear ocorreu 13 dias após o lançamento do filme Síndrome da China (estrelado por Jane Fonda e Jack Lemmon), que abordava um episódio fictício semelhante.

O desafio do lixo nuclear

O que acontece com o lixo nuclear? De início, deve-se considerar que há três tipos de resíduos nucleares: os de baixa, média e alta radiatividade (a passagem de uma classe à outra acima equivale a um aumento de cerca de mil vezes na radiação). Os primeiros, que incluem, por exemplo, rejeitos de indústrias e hospitais, podem ser estocados em depósitos provisórios. Os últimos, que abrangem os restos do combustível nuclear utilizado nas usinas, devem ir para depósitos permanentes.

Isso não ocorre com o lixo de Angra, empilhado em uma piscina de resfriamento ao lado do reator. Várias barreiras de aço, chumbo e concreto cercam a piscina e o próprio reator para minimizar o risco de vazamento. A piscina de Angra 2 pode guardar lixo nuclear por cerca de 40 anos, tempo estimado de funcionamento da usina.

As usinas, em si, são outro problema. Quando sua vida útil acaba, várias partes delas estão contaminadas e representam risco. Mas, até hoje, nenhuma usina foi desmontada, e os cientistas ainda não têm uma resposta definitiva sobre o que fazer com esse material.

(foto: Infonet)

Os planos brasileiros

Dono de várias opções de geração "limpa" de energia, o Brasil poderia ficar alheio à nova onda nuclear. Só o aproveitamento do bagaço da cana plantada em São Paulo, por exemplo, equivaleria à produção de cinco usinas como Angra 2. Mas o atual governo não só decidiu construir Angra 3 (1.405 megawatts), a um custo estimado de R$ 7 bilhões e com entrada em operação prevista para 2015, como planeja erguer até 2030 mais quatro novas centrais de energia nuclear. Segundo declarações de Carlos Henrique Mariz, representante da Eletronuclear (a subsidiária da Eletrobra s responsável pela área) no Nordeste, ao portal Invest NE, em março, duas usinas serão erguidas naquela região, com início de atividades em 2019 e 2021, e as demais, no Sudeste. Cada usina de 1.100 MW, como as projetadas para o Nordeste, custaria US$ 4,4 bilhões.

Em termos estratégicos, a ideia tem fundamento. Segundo as Indústrias Nucleares do Brasil (INB), empresa que beneficia o urânio e fabrica o combustível nuclear no Brasil, o País possui a sexta maior reserva desse minério do mundo (309 mil toneladas), capaz de abastecer 32 usinas nucleares de 1.400 MW durante os cerca de 60 anos de sua vida útil. Para Mariz, as usinas no Nordeste permitirão que a região deixe de importar energia, algo que faz desde os anos 1990.

Todas as providências estão sendo tomadas com relação à segurança desses empreendimentos, frisa Mariz. Com isso, a única grande questão em aberto seria o destino do lixo nuclear produzido pelas usinas. O Brasil tem apenas um depósito permanente de resíduos radiativos, em Goiás; os existentes em São Paulo, Minas Gerais e no Rio de Janeiro, localizados em centros de pesquisa nuclear, são provisórios.

Comentários:
A questão do crescimento da oferta de energia no Brasil, que tem de dar conta da contínua evolução do consumo, não é simples. A tradicional matriz hidrelétrica não pode ser expandida na mesma velocidade da demanda.

Parte da solução tem sido importar gás (da Bolívia, que estatizou as instalações montadas pela Petrobrás) para ser utilizado em usinas térmicas, poluentes e muito menos eficientes do que as hidrelétricas, além, claro, de usarem de recurso não renovável, mas de construção rápida.
Diante disto, e considerando também o fato de que o Brasil dispõe de amplas reservas naturais de urânio bem como da tecnologia de enriquecimento, estou convencido de que a energia nuclear é uma boa opção para atender à demanda nacional de energia de curto e médio prazos.
Cabe acrescentar que outras opções não devem ser desenconrajadas. Ao contrário, parques eólicos, usinas solares, pequenas centrais hidrelétricas, usinas de biomassa, são todas opções que devem ser estimuladas, inclusive por que têm fontes renováveis.
O que não pode ocorrer é ter o desenvolvimento do país tolhido ou retardado por falta de energia.
Sou, portanto, hoje em dia, favorável à energia nuclear.


Arq. Antonio Macêdo Filho

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Projetos para etiqueta de eficiência energética para prédios residenciais estão em consulta pública

Já o Procel para edifícios comerciais acaba de ser alterado e tem novo texto publicado. Agora, economia no uso de água passa a ser contemplada como bonificação da etiquetagem
Por Mauricio Lima, para Construção Mercado, publicado originalmente em PiniWeb

Depois dos edifícios comerciais, agora os residenciais devem ganhar etiqueta de eficiência energética

O Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) disponibilizou para consulta pública dois projetos para a formatação da Etiqueta Nacional de Conservação de Energia (Procel Edifica) para residências: o Regulamento Técnico da Qualidade do Nível de Eficiência Energética de Edificações Residenciais (RTQ-R) e os Requisitos de Avaliação da Conformidade para o Nível de Eficiência Energética de Edificações Residenciais (RAC-R).

O RTQ-R fica em consulta pública no site do Inmetro até esta sexta-feira (22). Esse regulamento define as condições técnicas necessárias de unidades habitacionais autônomas, de edificações residenciais multifamiliares e de áreas de uso comum de edificações multifamiliares ou de condomínios residenciais para o recebimento da etiquetagem.

Já o RAC-R, está em consulta pública desde o dia 13 de outubro, ficando disponível para visualização até 13 de novembro. O objetivo do RAC-R é definir, a partir do próprio RTQ-R, de que modo as edificações serão avaliadas, descrevendo a parte burocrática necessária para a obtenção do selo.

Etiqueta para edifícios comerciais

O Regulamento Técnico da Qualidade do Nível de Eficiência Energética de Edifícios Comerciais, de Serviços e Públicos (RTQ-C) para edifícios comerciais passou por revisão é já está disponível. As alterações foram publicadas na última quinta-feira (14).

A nova portaria apresenta modificações nos requisitos para a aprovação da envoltória, sistemas de iluminação e de condicionamento de ar. Além disso, a economia no uso de água passa a ser contemplada como bonificação da etiquetagem. Ainda foram adicionados à nova portaria novos materiais que serão levados em consideração na avaliação.

O Laboratório de Eficiência Energética em Edificações (LabEEE), laboratório indicado pelo Inmetro para realizar as avaliações e o único a fornecer as etiquetas, disponibilizou uma versão da nova portaria, com as mudanças destacadas na cor azul.

A validade da etiqueta é de cinco anos, prazo em que os edifícios certificados deverão passar por novas avaliações do Inmetro. No Brasil, 14 edifícios já têm a certificação.

Prorrogado prazo para o início de validade da Norma de Desempenho da ABNT

Por Felipe Benevides, para Revista Construção Mercado, publicado originalmente em PiniWeb

Pesquisadores defendem índices de conforto térmico e acústico e desmitificam a Norma de Desempenho. Consultora critica a desarticulação do setor e a prorrogação do prazo de início de validade da Norma de Desempenho

No segundo dia do Construtech (evento promovido pela Pini ,realizado esta semana em São Paulo) participantes debatem desempenho acústico, conforto térmico e vida útil das edificações

"Somos uma ilha técnica que não olha para fora. Por isso estamos trinta anos atrasados." A palestra que abriu o segundo dia do Construtech não poderia ter começado mais quente. As palavras da engenheira civil Maria Angélica Covelo Silva, consultora da NGI, tocaram os profissionais da platéria preocupados na implantação da NBR 15.575 nos novos projetos. A Norma de Desempenho de Edificações de até Cinco Pavimentos, que deveria ser exigida a partir do dia 12 próximo mês, teve a data de cumprimento prorrogada para 12 de março de 2012. A decisão tomada pela Comissão de Estudo de Desempenho de Edficações do CB-02 da Associação Brasileira de Normas Técnicas atendeu à solicitação de diversas entidades do setor da construção, fabricantes e construtores.

Para Maria Angélica o "incômodo" é injustificado, e algumas das críticas se devem muito mais ao desconhecimento da norma do que pelas exigências. Esse problema, segundo a palestrante, poderia ser evitado com maior articulação do setor.

Ao tratar da vida útil das edificações, Maria Angélica ressaltou a importância de se avaliar a exposição das estruturas à salinidade, poluição e umidade, os maiores inimigos da durabilidade. A engenheria esclareceu também a diferença a relação entre vida útil e prazo de garantia, a partir das características dos componentes, classificados como: substituível, de curta duração, manutenível e não-manutenível.

Acústica e conforto térmico

A Norma de Desempenho avalia a quantidade e não a qualidade do ruído, explicou o físico Marcelo Mello Aquilino, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo. "Escalado" para sanar dúvidas sobre a questão do desempenho acústico, Aquilino disse que o maior desafio nos projetos é resolver o problema de transmissão de ruídos de impacto sobre o piso. O físico explicou como as normas NBR 10.151 e 10.152, que estabelecem os critérios de medição de ruídos e conforto acústico, foram integradas na NBR 15.575. Aquilino fez uma recomendação aos profissionais: prestar atenção aos acabamentos e eliminar as frestas entre os elementos construtivos, para evitar perda de isolamento acústico.

Assim como na área acústica, no campo do conforto térmico a Norma de Desempenho não será de difícil aplicação, acredita Adriana Brito, também pesquisadora do IPT. Para chegar aos índices de conforto exigidos pela norma, a arquiteta recomenda que se faça uma análise climática das temperaturas locais para balizar as diretrizes de projeto. "A amplitude térmica e a inércia térmica têm uma relação", disse a arquiteta, explicando os métodos de avaliação da transmitância térmica (fator isolante) e da capacitação térmica (fator absorvente) de paredes de vedação e da cobertura. Para ela, esses dois elementos devem cetralizar as maiores preocupações nos projetos, requerendo uma abordagem mais técnica na escolha dos materiais.

Norma aplicada

Antecipando-se à entrada da norma em vigor, a construtora Tecnisa já "coleciona" algumas certezas e diretrizes para seus projetos. O engenheiro civil Maurício Bernardes está convicto da melhoria da qualidade dos projetos pelo poder de "indução" da Norma ao voltar o foco para o consumidor. A construtora já fez diversos estudos de contrapisos, tratamento de instalações hidráulicas e "blindagem" acústica do poço de elevadores. Ao mostrar alguns resultados obtidos pela construtora, Bernardes disse ser possível incorporar diversas melhorias nos projetos dentro de uma relação custo-benefício factível para as construtoras. Segundo a máxima de que o "diabo mora nos detalhes", Bernardes disse que os problemas normalmente apontados pelos consumidores, a despeito do cumprimento das exigências da Norma, poderiam ser resolvidos com maior atenção ao refinamento do projeto. O engenheiro cobrou de fornecedores a melhoria de alguns produtos, para que os resultados possam ser atingidos.

As críticas não deixaram de ser ouvidas pelo também engenheiro civil Roberto Pimentel Lopes, empresário do segmento de portas e coordenador da nova Norma de Portas de Madeira, que prevê os aspectos de desempenho e durabilidade deste produto. O segmento foi sempre um dos mais criticados pelos construtores e agora conta com um referencial seguro de avaliação de qualidade, acredita o empresário. Pimentel analisou, junto com os expectdores, aspectos como a estabilidade, segurança em uso e acústica previstos no texto. O maior ganho, acredita, será na padronização das portas. O empresário defende que as empresas deste setor tenham um profissional especializado em especificações normativas, levando para o mercado apenas produtos comprovadamente eficientes. A construção civil precisa, segundo Pimentel, sofrer o mesmo impacto sofrido pela indústria automobilística.

Meus comentários:
O adiamento do início da validade da Norma de Desempenho adia também o avanço na melhoria da qualidade das construções brasileiras. Fica para mim evidente o despreparo de grande parte da comunidade do setor, que, ao depararem com demandas técnicas mais exigentes, preferem encontrar desculpas, seja nos custos, seja nos processos, para deixar de enfrentar a questão. 

Alguns poderão certamente argumentar que o famoso distanciamento entre a academia e o mercado possa ter provocado a proposição de metas demasiadamente ambiciosas para o que o mercado estaria disposto a pagar. Talvez tenham razão.
O fato é que não são poucos os casos que comprovam que a aproximação dos dois setores tende a benefiar a todos, pricipalmente as empresas e o público em geral, usuários de edificações de alto desempenho.
Acho que perdermos uma grande chance de dar mais um passo importante nesta direção.

Prof. Arq. Antonio Macêdo Filho

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Edifício envidraçado ganha prêmio de arquitetura sustentável

Publicado originalmente em CicloVivo, em 11/05/2010

A sede do Banco Europeu de Investimentos (na sigla em inglês, EIB), localizada em Luxemburgo, ganhou recentemente o primeiro lugar no prêmio Emilio Ambasz de arquitetura sustentável para edifícios internacionais.

O edifício projetado pelo escritório alemão, Ingenhoven Architects, foi concluído em 2008. Feito em vidro tubular, ele foi premiado devido sua consciência ecológica, eficiência energética e pela disposição de seus escritórios, que promovem interação e comunicação. O edifício inovador possui muitos jardins de inverno e de verão e também garantiu a classificação “Very Good” no programa de certificação britânico BREEAM (Building Research Establishment Environmental Assessment Method).

A sede do EIB é constituída por uma estrutura de metal com vidros em ziguezague de 170 metros de comprimento. O projeto é inovador pois não tem as características de um edifício coorporativo comum. Sua planta permite a flexibilidade dos escritórios e interação entre funcionários. Os 72.500 m2 de área construída tem espaço suficiente para 750 funcionários e possui um atrium interno, café, restaurante e conexão entre edifícios próximos.

Como o edifício é inteiramente coberto por vidro (13.000 m2), a luz do dia penetra no prédio por todos os ângulos. Janelas operáveis permitem que os funcionários controlem individualmente a abertura da janela, controlando a temperatura e iluminação. Um jardim de inverno, ao lado do edifício, funciona como um isolante térmico, eliminando o uso de aquecedor ou ar condicionado.

Telhas de vidro permitem cortar despesas no aquecimento

Por Isabel Palma, para Naturlink.sapo.pr - Outubro 2010


Através da substituição das telhas convencionais por telhas de vidro é possível fornecer energia a um sistema de aquecimento, possibilitando a redução do consumo energético.

Esta nova tecnologia baseia-se na aplicação de telhas de vidro que permitem o aproveitamento da radiação solar.Estas telhas estão apoiadas num material preto que absorve a radiação solar e permite o aquecimento do ar. Este ar quente é aproveitado e distribuído através de um sistema de aquecimento central.

Este modelo está desenhado de forma a ser possível integrar com sistemas de aquecimento baseados em água ou ar. O único requisito é a pré-existência de algum tipo de sistema de aquecimento central.

A sua configuração permite aquecer a casa durante o Inverno e transferir o calor absorvido durante o Verão, para um sistema de dissipação de calor no solo, para ajudar a alcançar um efeito refrescante.

O sistema deve gerar cerca de 350kWh de energia por metro quadrado, valor que varia com o clima, o ângulo dos telhados e direcção das casas.

Se o telhado não for adequado para colocação de telhas, a mesma tecnologia está disponível em painéis de vidro, que podem ser adaptados às paredes das casas, para beneficiar dos raios solares baixos, durante o Inverno.

A companhia sueca Soltech Energy que desenvolveu esta tecnologia recebeu recentemente uma medalha de ouro, na feira Nordbygg 2010 em Estocolmo, por este projecto.

Fonte: http://www.gizmag.com/

domingo, 17 de outubro de 2010

Governo de São Paulo obtém certificação AQUA para duas escolas públicas

Postado originalmente em CicloVivo, em 05/10/2010

A Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), responsável pela rede física escolar da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo, obteve certificação pelo Processo AQUA em duas de suas escolas na capital, a Escola Estadual Bairro Luz (Centro) e a Escola Estadual Vila Brasilândia (Zona Norte).

O principal benefício da certificação sustentável - atestada pela Fundação Vanzolini - é comprovar de maneira inequívoca que as escolas não agrediram o meio ambiente durante as obras e a operação, economizando água, energia e gerando poucos resíduos. Além disso, as escolas certificadas têm níveis de conforto ambiental e soluções arquitetônicas projetadas com foco na saúde dos alunos.

“O Processo AQUA levou a FDE a repensar o projeto de maneira global, com a possibilidade de avaliar o impacto de cada solução sustentável no edifício como um todo”, explica Luiz Henrique Ferreira, diretor da Inovatech Engenharia, consultoria líder para certificação AQUA, e consultor da FDE em seus projetos sustentáveis.

A utilização de brises nas fachadas é prática comum na FDE e, com o AQUA, a equipe fez uma avaliação do desempenho destes em relação ao conforto térmico e iluminação natural. Isso levou a algumas alterações no projeto em busca de melhores índices de desempenho. Uma outra mudança aconteceu no tratamento acústico das escolas, que demandou uma análise mais global dos impactos dos ruídos, tais como a interferência de quadras poliesportivas próximas às salas de aula.

A Fundação já possuía um programa que visava o baixo impacto ambiental nos canteiros de obra, além de reaproveitamento de água da chuva, adotado em uma escola em Perus (SP), no início de 2008, com apoio da Inovatech, na época. “A questão da facilidade e baixo custo de manutenção também sempre foi um item importante para a entidade. Dessa maneira, o processo AQUA serviu para integrar diversas ações que estavam sendo conduzidas de maneira isolada”, avalia Ferreira.

Uma peculiaridade da Escola Bairro Luz foi a sua localização, no Centro de São Paulo, em uma área de preservação histórica, o que levou a FDE a ter uma grande preocupação com o impacto que geraria no entorno, quesito que inclusive foi certificado pela Fundação Vanzolini durante a auditoria.

Para professores e alunos, a certificação pode representar um contato, na prática, com a sustentabilidade nas construções. “O fato de estarem dentro de uma escola sustentável de verdade, certamente contribuirá para que os alunos e professores percebam a importância da preservação do meio ambiente e levem para casa os conceitos de sustentabilidade”, afirma Ferreira.

O Processo AQUA tem ainda potencial para gerar um programa pedagógico nessas escolas, de modo a ajudar a compreender o conceito da construção sustentável. Diversos itens, como a captação de águas de chuva e locais específicos para coleta seletiva de lixo permitirão ações pedagógicas para conscientização dos alunos e comunidade local, reforçando o comprometimento da escola com a educação ambiental.

A certificação AQUA é oportuna também pela indução que o processo promoverá nas atitudes cotidianas dos usuários. Um prédio concebido para ser sustentável merecerá esforços para a preservação deste conceito. Caso a transferência de conhecimentos seja feita de maneira adequada, o processo poderá ter reflexos na atenção dos usuários com os temas associados à sustentabilidade.

BH está perto de ter seu primeiro edifício com certificação LEED

Publicado originalmente em CicloVivo.com.br, em 14/10/2010

Edifício Forluz terá certificação LEED Gold

O primeiro prédio verde de Belo Horizonte começa a tomar forma e será inaugurado em 2012. O edifício da Fundação Forluminas de Seguridade Social (Forluz), buscou junto ao Green Building Council Brasil (GBC Brasil), a certificação Leadership in Energy and Environmental Design (Leed), o mais importante certificado concedido aos edifícios engajados com o meio ambiente. A construção foi projetada por arquitetos do escritório Gustavo Penna Arquiteto & Associados, em conjunto com o escritório Trínia e está localizada no bairro de Santo Agostinho, na capital mineira.

A certificação é uma ferramenta importante dentro de uma construção sustentável. Ela é a certeza de que ao longo do tempo o edifício se mostrará racional e econômico do ponto de vista financeiro e ambiental. Segundo a GBC Brasil, órgão responsável por viabilizar a certificação do Leed, o Brasil é o quinto país com maior número de empreendimentos certificados, já passam de 100; ficando atrás somente de Estados Unidos, Emirados Árabes, Canadá e China.

Para a implantação do projeto de Belo Horizonte foram levadas em consideração as fontes de energia renováveis, como o aquecimento solar de água e sistema fotovoltaico de geração de energia. A economia de energia elétrica virá de equipamentos eficientes e lâmpadas de baixo consumo, associados à tecnologia de eficiência energética da própria construção, como o vidro usado nas fachadas, que será de grandes dimensões para o maior aproveitamento da luz natural.

As vidraças permitirão iluminação natural em 75% da área do prédio, sendo que 90% da área construída terá acesso visual às paisagens externas. Na fachada norte, a tecnologia de vidro associada à brises, garante proteção solar. O sistema de sombreamento é dotado de sensores de luminosidade, que serão acionados automaticamente quando houver excesso de sol. A luz interna é regulada de acordo com a intensidade de luz externa.

A maior parte dos materiais utilizados na construção será reciclada. O cimento, por exemplo, apresenta baixo índice de compostos orgânicos voláteis. As madeiras também foram substituídas por moldes pré-fabricados, reutilizáveis de polipropileno. A escolha dos materiais levou em consideração sua origem pra diminuir o impacto do transporte. Além disso, os resíduos produzidos na operação são destinados à reciclagem.

O sistema de reaproveitamento de água também está presente na edificação; as águas do lavatório e chuveiros servirão para abastecer a descarga dos vasos sanitários. As águas pluviais coletadas em um reservatório serão destinadas à irrigação, bem como as provenientes dos drenos do sistema de ar condicionado. Isso reduzirá o consumo em, pelo menos, 40%. O sistema de automação monitorará o funcionamento de todas as instalações do edifício para garantir a eficiência energética e hidráulica.

A edificação tem 24 pavimentos e cinco subsolos e o terreno é ocupado, em sua maioria, por uma praça aberta para a cidade, reduzindo o impacto da construção para o entorno.
Segundo Laura Penna, uma das arquitetas responsáveis pelo projeto, “a construção de um prédio verde é mais cara que a das obras convencionais, mas, por outro lado, é uma construção que gera muitos benefícios. O investimento é revertido nas economias que o prédio proporciona depois de pronto”. Para ela o prédio verde da Forluz, trará também inúmeros benefícios aos usuários, pois esse tipo de construção aumenta a qualidade real do ambiente, melhorando a própria saúde e a produtividade dos futuros trabalhadores.

Comentários:
Para conhecer como funciona a certificação LEED, participe dos cursos oferecidos pelo GBC Brasil voltados para cada uma das categorias da certificação. Mais informações em:
www.ecobuilding.com.br.

Em breve aqui no blog trarei mais informações também sobre cursos de Pós-Graduação em Construção Sustentável.

Arq. Antonio Macêdo Filho

II Missão Técnica Dubai & Abu Dhabi - ArqTours, by Raquel Palhares

Caros,

Segue programação para a II Missão Técnica Dubai & Abu Dhabi da ArqTours, by Raquel Palhares. Eu estive na primeira, no ano passado, e posso garantir: É mesmo muito interessante. Recomendo.

Recomendo também que leia meus comentários e impressões sobre Dubai no artigo: "Insustentável Dubai", que escrevi depois da viagem e pouco antes de ser anunciada a crise financeira no Emirado. Acho que estava prevendo que algo estranho e incrível estava (e ainda está) acontecendo... Aguardo seus comentários também.

Arq. Antonio Macêdo Filho


(Clique na imagem para aumentar)

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Em uma fachada de vidro, bate um sol forte que ofusca e esquenta muito. Como resolver?

Por Fernando Forte e Rodrigo Marcondes Ferraz, para Uol.com.br - Outubro 2010

Detalhe da fachada do edifício Copan, em São Paulo, projeto de Oscar Niemeyer.

Uma forma eficiente de resolver esse problema é instalar brises junto à fachada do edifício. Também conhecidos pela expressão francesa brise-soleil, os brises são elementos sombreadores utilizados nas construções. Uma tradução direta do francês seria algo como "quebra sol". Esses elementos possuem diversos formatos e podem ser feitos dos mais variados tipos de material e aplicados de muitas maneiras em projetos de arquitetura. Existem brises de aletas verticais, horizontais, fixos e móveis; há os em colméia, inclinados, feitos de cobogós, perfurados e em inúmeros outros formatos e materiais. Existem até brises orientados por computador, que abrem ou fecham conforme a incidência solar.

Além de funcionais, os brises definem a estética da fachada do Palácio Gustavo Capanema, no Rio

Ainda que existam há muitos séculos, em diversas arquiteturas mundo a fora, como as clássicas tramas da arquitetura mourisca, por exemplo, os brises foram amplamente divulgados e utilizados no mundo durante o modernismo, e se tornaram um dos ícones da arquitetura moderna.

Sua função básica é dupla: proteger o interior e/ou a fachada das edificações do sol excessivo, controlando, assim, a temperatura no interior da construção e também evitando o ofuscamento que a iluminação abundante pode causar. Às vezes pode ter outras funções secundárias, como prover privacidade: podem ser usados para sombrear resguardar um ambiente envidraçado.

Exemplos de utilização

Os brises foram largamente utilizados no Brasil. Um dos grandes exemplos da utilização inovadora desses elementos é o prédio do Ministério da Educação e Cultura no Rio de Janeiro, o conhecido Palácio Capanema, projeto realizado por uma equipe de arquitetos liderada por Niemeyer, Le Corbusier e Lucio Costa. Nesse edifício dos anos 30, brises móveis contornam a fachada do edifício. O edifício Copan, em São Paulo, também tem sua expressividade amplificada pelo uso intenso de brises.

Mas não só na arquitetura modernista do inicio do século podemos encontrar os brises-soleil. Eles são comumente encontrados na boa arquitetura contemporânea, como pode ser observado na fantástica obra de João Filgueiras Lima, o Lelé, no edifício da Fnac, em São Paulo, desenhado por Paulo Bruna, e no famoso Instituto do Mundo Árabe de Jean Nouvel.

Como diafragmas de máquinas fotográficas, os brises do Instituto do Mundo Árabe (de Jean Nouvel, em Paris) abrem e fecham conforme a incidência de luz

Como os brises são elementos que ajudam a controlar a insolação nas construções, esse tipo de solução vem de encontro às recentes preocupações com a sustentabilidade das construções. Ora, se a fachada de um prédio pode ser sombreada por interessantes brises, preservando a transparência desejada, porque aplicar apenas vidro e depois gastar uma quantidade imensa de energia com ar-condicionado? Esse tipo de questão é importante se fazer ao realizar sua obra, ou mesmo observar a cidade ao seu redor. Se o movimento moderno deixou uma lição relevante para os conceitos de sustentabilidade, certamente é a larga e inteligente utilização de brises, pois eles aumentam muito a eficiência energética das construções.

Veja também, dos mesmos autores:
Como garantir o conforto térmico em casa nos dias quentes?
Como manter a casa confortável também no inverno?

Comentários:
Ao passo em que parabenizo os autores pelo artigo, que em linguagem acessível aborda questões técnicas importantes - não somente neste caso, mas também em outros publicados pelo Uol.com.br -acrescento para os leitores do Blog do Macêdo que estratégias passivas de projetos de arquitetura representam as mais eficazes do ponto de vista do custo-benefício, em se tratando de eficiência energética das edificações.
Estes e outros assuntos relacionados às tecnologias utilizadas para garantir o melhor desempenho dos edifícios eu abordo no meu curso Arquitetura Sustentável - Técnicas e Tecnologias para a Sustentabilidade na Construção.
Mais informações em: www.ecobuilding.com.br.


Prof. Arq. Antonio Macêdo Filho.

Brasileiro produz tanto lixo quanto europeu

Estudo em 364 cidades mostra que o País já se aproxima dos Estados Unidos, o campeão
Por Andrea Vialli - O Estado de S.Paulo


Lixo acumulado em rua de São Paulo (Foto: Clayton de Souza/AE)

O brasileiro já produz a mesma quantidade de lixo que um europeu. A melhoria do poder de compra dos brasileiros está fazendo com que a população do País gere cada vez mais lixo inorgânico, como embalagens, ao mesmo tempo em que a implantação de programas de coleta seletiva e os níveis de reciclagem não crescem na mesma medida.

A média de geração de lixo no Brasil hoje é de 1,152 kg por habitante por dia, padrão próximo aos dos países da União Europeia, cuja média é de 1,2 kg por dia por habitante. Nas grandes capitais, esse volume cresce ainda mais: Brasília é a campeã, com 1,698 kg de resíduos coletados por dia, seguida do Rio, com 1,617 kg/dia, e São Paulo, com 1,259 kg/dia.

Além disso, o volume de lixo cresceu 7,7% em 2009 - foram 182 mil toneladas/dia geradas em 2009, ante 169 mil toneladas/dia no ano anterior. Os dados fazem parte do estudo "Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil 2009", que será divulgado hoje, no Rio.

O estudo, anual, abrange 364 municípios e foi realizado pela Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), entidade que reúne as empresas de coleta e destinação de resíduos.

Alcançamos um padrão europeu de geração de resíduos e estamos nos aproximando dos americanos. Infelizmente, isso está acontecendo sem alcançarmos o mesmo grau de desenvolvimento desses países", afirma Carlos Roberto da Silva Filho, diretor executivo da Abrelpe.

Segundo ele, a produção de lixo em capitais como Brasília caminha para se tornar próxima aos 2,8 kg por habitante/dia, que é a média de um cidadão americano. "Isso revela muito sobre hábitos de consumo e descarte dos moradores dessas cidades. Quanto mais alta a renda, maior o consumo de comida pronta, por exemplo, que implica em excesso de embalagens", afirma.

De acordo com o levantamento, 56,8% desse lixo vai para aterros sanitários, 23,9% vai para aterros controlados (que não possuem tratamento de chorume) e 19,3% termina em lixões. Os aterros das grandes cidades, no entanto, caminham para a saturação. "Os resíduos gerados na cidade de São Paulo hoje são enviados para aterros a 30 km de distância", diz Silva.

Entulho

E não são apenas os resíduos que caracterizam o lixo doméstico (resto de alimentos, embalagens) que estão em expansão. O País também está produzindo mais entulho de construção: hoje, na média, cada brasileiro produz 0,576 kg de resíduos de construção civil. Em 2009, foram 91,4 mil toneladas/dia do entulho - um crescimento de quase 14% em relação a 2008, quando foram geradas 80,3 mil toneladas por dias de entulho.

Segundo Silva, isso é reflexo do bom momento da economia e do setor de construção em especial. "Há mais pessoas construindo e nenhuma lei que regulamente o descarte desses materiais."

Lei nacional. Uma das saídas para o problema do aumento do lixo é a lei nacional de resíduos sólidos. O projeto foi aprovado na Câmara em março, após 19 anos de idas e vindas, e agora aguarda votação do Senado.

Várias entidades, incluindo representantes da indústria e de ONGs, fazem pressão para que a lei saia até 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente. "A expectativa é de que a lei já seja sancionada pelo presidente Lula na data", diz Fernando Von Zuben, diretor de meio ambiente da indústria de embalagens Tetra Pak e um dos articuladores do grupo de trabalho sobre o tema.

Faça sua parte

Evite o desperdício
Planeje a compra de alimentos para não haver desperdício. Dimensione a compra de produtos perecíveis com as necessidades da família.

Busque a durabilidade
Procure comprar produtos mais duráveis. Evite descartáveis.

Reduza embalagens
Evite comprar frutas, verduras e legumes embalados. Dê preferência para produtos vendidos a granel: leve a embalagem de casa. Escolha produtos com menor número de embalagens. Opte por produtos com refil e reduza o uso de sacolas plásticas.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Questões de Sustentabilidade - Revista Téchne

A revista Téchne, da Pini, em sua edição de setembro 2010, apresenta interessantes matérias e entrevistas dedicadas à Sustentabilidade das Construções. Reproduzo a seguir algumas questões levantadas pela publicação.

Arquitetura Sustentável


A sustentabilidade pode comprometer os anseios do arquiteto e limitar a produção intelectual e artística, empobrecendo os projetos? Como a sustentabilidade pode se casar com harmonia com a arquitetura?


Centro Brasileiro Britânico, projetado por Botti Rubin Arquitetos Associados

Entendemos que não. A sustentabilidade não compromete o projeto nem limita a atuação do arquiteto. Há algum tempo estamos refletindo sobre o assunto no Comitê Temático de Projeto do CBCS (Conselho Brasileiro de Construção Sustentável), com temas ainda emergentes do grupo de sustentabilidade da AsBEA (Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura). Sempre afirmamos que a sustentabilidade não é um objetivo em si a ser alcançado. Não é uma situação estanque, mas sim um processo, um caminho a ser seguido. Toda a criação nessa área é feita a partir de intenções que são renovadas continua e progressivamente. Intenções essas genuínas, que devem estar verdadeiramente compromissadas com os valores do cliente, este entendido como a síntese do contratante, do usuário e da comunidade socioambiental onde o projeto e a obra estão inseridos.

Não existe a fase ou etapa "sustentabilidade" no processo projetual. Quando isso ocorre pouco se agrega ao resultado final. Existe, sim, a opção pelo sustentável que permeia todo o processo. Esse exercício permanente e constante de lidar com o desejo ao desenvolver seu trabalho pode trazer dúvidas e conflitos ao projetista. A natureza sempre foi e é minimalista. Usa com eficiência a economia de recursos. Isso quer dizer que seremos obrigados a fazer uma transição. Desenvolvemos o saber e o saber fazer com a sociedade de consumo. Vamos ter que fazer o mesmo com a sociedade da sustentabilidade.

Assim, o desafio está em aprender a lidar com esses valores, com as novas possibilidades e conhecimentos tecnológicos que nos permitem criar modelos e soluções adequadas às demandas atuais. Aliás, se fala muito que a boa arquitetura foi, é e será sempre sustentável naturalmente. Não discordamos, apenas entendemos que é necessário aprofundar essa avaliação e desenvolver instrumentos que possibilitem a medição inequívoca de boa parte dessas qualidades.

Exemplo evidente é a disponibilidade atual de dezenas de softwares que permitem a elaboração de modelos arquitetônicos para testar a eficiên­cia energética de soluções bioclimáticas e que mal são utilizados. Propor, medir, explicitar valores e procedimentos são ações que podem sugerir caminhos ou tendências.

Necessitamos mudanças de postura para harmonizar sustentabilidade e arquitetura. Senão, vejamos: quantos projetos são concebidos e construídos considerando o ciclo de vida do ambiente construído? Quais são os processos incorporados à arquitetura e implantados na prática que permitem a redução, mitigação e por final disposição de todos os resíduos produzidos por uma obra? Como medir desempenho dos componentes e garantir habitabilidade, durabilidade e manutenibilidade dos espaços e materiais envolvidos numa construção? Temos um longo caminho a percorrer, mas acreditamos que chegará o momento que não precisaremos mais qualificar e diferenciar arquitetura sustentável de não sustentável; nossas demandas serão outras. A sustentabilidade orientará os projetos naturalmente e a criatividade será mais estimulada na nova beleza da sustentabilidade.

Paulo Lisboa, arquiteto e urbanista
sócio-titular do escritório Paulo Lisboa Arquitetura e membro do Conselho Deliberativo do CBCS (Conselho Brasileiro de Construção Sustentável)

Edifícios Sustentáveis

Quais os projetistas nacionais e internacionais considerados referência em projetos sustentáveis?

Edifício da empresa de seguros Swiss Re, em Londres, de Norman Foster

A resposta a isso depende do entendimento do que sejam projetos sustentáveis. No exterior há vários escritórios, grandes ou pequenos, que desenvolvem projetos com altos níveis de desempenho ambiental. A dimensão social ainda é pouco explorada, enquanto as restrições econômicas concretas para um projeto típico nem sempre se aplicam, por se tratarem, muitas vezes, de casos emblemáticos ou projetos demonstrativos. Nos Estados Unidos, são considerados referências os escritórios HOK - apontado como principal projetista de edifícios sustentáveis no EUA por dois anos consecutivos - Bill Berkerbile, do BNIM Achitects e o arquiteto William McDonough, ambos pioneiros do movimento de arquitetura sustentável norte-americano. Outro nome de destaque é Renzo Piano, que consistentemente alia qualidade arquitetônica insuperável com alto desempenho, como no caso da ala moderna do Instituto de Arte de Chicago.

Na linha que se vale mais de tecnologia avançada e de alto nível de sofisticação, sem dúvida um dos primeiros nomes que ocorrem é naturalmente o do escritório de Foster+Partners, responsável por projetos como o Commerzbank Headquarters Building em Frankfurt, na Alemanha, considerado o primeiro arranha-céu "verde"; o edifício da prefeitura municipal e o edifício da empresa de seguros Swiss Re (foto), ambos em Londres, na Inglaterra. Este último edifício é interessante por resgatar a concepção do climatroffice de Buckminster Fuller dos anos 1970, os quais possuíam envoltórias de módulos triangulares (aplicados também nos geniais geodomos de Fuller) e com jardins internos. O emprego de ferramentas sofisticadas de otimização de forma resultou na previsão, em projeto, de 20% de economia no consumo energético para a climatização. O edifício da prefeitura de Londres, por sua vez, seguiu o mesmo procedimento do Swiss Re para determinação aerodinâmica de forma, e autossombreamento, além do emprego de acoplamento com o solo para otimização do desempenho energético. A Hearst Tower, outro projeto de Foster, este em Nova Iorque, nos Estados Unidos, lançou mão novamente de módulos triangulares para reduzir substancialmente o consumo de material utilizado na estrutura.

No extremo do uso racionalizado de recursos, estariam arquitetos como Mick Pearce, que desenvolveu obras-primas como o EastGate Center, em Harare, no Zimbábue, e o CH2, em Melbourne na Austrália. No East Gate Center, ao mimetizar um cupinzeiro, conseguiu produzir um centro comercial de vários pavimentos sem condicionamento artificial em plena savana africana. O edifício foi projetado para usar apenas 10% da energia consumida por um edifício de seu tipo e porte. Infelizmente, a solução para intensificar a efetividade da ventilação natural desenvolvida por Arup Associates, outro nome sempre presente em projetos de engenharia para sustentabilidade, não receberam a manutenção necessária e hoje já não funcionam. No CH2 o aprendizado obtido no EastGate foi levado a um outro nível, mesclando soluções de alta e baixa intensidade tecnológica, indo desde a correta utilização de brises, até o uso de material de mudança de fase para condicionamento e o emprego de microturbinas eólicas.

No Brasil, seguramente um arquiteto que se destaca por trabalhar consistentemente em busca de soluções mais sustentáveis, antes mesmo que se tornasse uma demanda comercial, é João Filgueiras Lima, o Lelé. Sua criatividade para desenvolver soluções inovadoras e eficientes, principalmente, de ventilação natural, diante da limitação tecnológica e de recursos disponibilizados, ainda hoje não encontra muitos pares.

Vanessa Gomes, arquiteta e urbanista
Professora-associada do Departamento de Arquitetura e Construção da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e professora visitante do Department of Chemical and Petroleum Engineering da University of Pittsburgh, nos Estados Unidos

Telhados Verdes


Para que a cobertura verde tenha realmente um papel de auxílio à sustentabilidade, que aspectos devem ser considerados? Qual o desempenho dessas coberturas ao longo do tempo?

Telhados verdes oferecem uma estratégia inteligente e de alto impacto para amenizar a aridez e os efeitos das mudanças do clima nas cidades modernas. Inúmeras cidades por todo o mundo já reconhecem esses serviços e oferecem incentivos fiscais e reduções de impostos, sinalizando mudanças de rumo no planejamento e reestruturação da infraestrutura urbana. Grandes obras públicas e privadas já caminham nessa direção. Para criar e manter esses novos ecossistemas em longo prazo, a composição da tecnologia de cultivo sobre áreas impermeáveis é fundamental - todos os componentes do telhado verde devem colaborar para seu desempenho ao longo do tempo em condições adversas: engenharia de drenagem, armazenamento de água, espaço/volume para crescimento de raízes, substrato leve e em proporções adequadas para que não seja necessária a reposição constante, seleção de plantas (um gramado consome pelo menos quatro vezes mais água do que algumas espécies de plantas suculentas).

Uma vez bem estabelecido, o telhado verde tem longa durabilidade. Um artigo publicado em maio deste ano na revista especializada norte-americana Ecological Engineering compara a performance a longo prazo de diversos telhados verdes construídos em Berlim desde 1880. O estudo comparou esses sistemas antigos aos sistemas modernos estabelecidos a partir da década de 1980. Segundo os autores, os telhados verdes modernos têm um desempenho muito superior aos sistemas antigos, devido às tecnologias aplicadas, havendo correlação positiva entre a capacidade de armazenamento de água do sistema e o índice de cobertura vegetal. Sistemas de armazenamento de água da chuva ajudam na eficiência do telhado verde, mas não excluem uma avaliação da necessidade de irrigação, que pode ser obrigatório para algumas espécies. Um plano mínimo de manutenção é recomendável.

Sérgio Rocha, engenheiro-agrônomo
diretor do Instituto Cidade Jardim

Selo Procel

Como funciona a etiquetagem Procel Edifica de consumo de energia? Para que uma edificação obtenha a etiqueta, que medidas deve adotar em todas as frentes de funcionamento dos sistemas?

A etiquetagem de edificações se torna eficaz para a redução do consumo de energia elétrica à medida que pode ser usada como ferramenta para contratação de projetos mais eficientes ou para o estabelecimento de metas de melhoria por grandes contratantes, tanto públicos quanto privados. Pode ser, ainda, parâmetro para concessão de melhores condições de financiamento bancário, como já vem ocorrendo no Programa ProCopa Turismo - Hotel Eficiência Energética, do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O processo de etiquetagem, consolidado no Brasil em 2009, ocorre em duas etapas: começou pelas edificações comerciais, de serviços e públicas, e deve, já em 2010, ser ampliado para as edificações residenciais. A etiqueta para os edifícios é bastante semelhante àquela já utilizada pelo Inmetro nos equipamentos eletrodomésticos, sendo que, para as tipologias de edificações da primeira etapa, considera a classificação do nível de eficiência energética de três subsistemas: Envoltória (relacionada aos materiais usados nas fachadas e cobertura), Iluminação e Condicionamento do Ar. Os edifícios ventilados naturalmente, mesmo que não integralmente, ou seja, que conjuguem ventilação natural e climatização artificial, poderão ter a parcela naturalmente ventilada avaliada para que seja classificada a sua eficiência, considerando, ainda, critérios de conforto ambiental.

Além dos sistemas individuais, existe a possibilidade de concessão de bonificações para medidas que, comprovadamente, representem economia direta ou indireta de energia como, por exemplo, dispositivos economizadores de água ou uso de fontes alternativas. A classificação varia de A (mais eficiente) até E (menos eficiente) e poderá ser feita de forma parcial. A envoltória, contudo, sempre terá que ser avaliada. São etiquetáveis, nesta primeira etapa, as edificações comerciais, de serviços e públicas com área a partir de 500 m² ou com tensão superior a 2,3 kV. Existem duas formas para a classificação do nível de eficiência energética do edifício: método prescritivo e simulação computacional. No método prescritivo, é usada uma equação onde se pondera os subsistemas. O condicionamento do ar vale 40% da nota e, os demais, 30% cada, para se chegar à classificação geral. A outra forma de classificação ocorre por simulação computacional, quando se compara o consumo anual de energia do projeto proposto simulado com um modelo de referência construído pelo método prescritivo para o nível de efi­ciên­cia energética que se deseja alcançar. A etiqueta é concedida para o projeto da edificação após avaliação, e para a edificação construída, após inspeção amostral, onde é verificada a conformidade entre a obra e o projeto. Para que uma edificação obtenha boa classificação, deverá seguir os critérios estabelecidos com essa finalidade nos regulamentos técnicos publicados pelo Inmetro.

Convém ressaltar, ainda, que existem diversos pré-requisitos a serem atendidos, desde gerais, como a possibilidade de medição individualizada de cada um dos subsistemas, nos prédios novos, até pré-requisitos específicos para cada um dos subsistemas. Dentre os pré-requisitos específicos, destacamos a adequação dos materiais das fachadas às condições bioclimáticas da região em que o prédio está localizado; soluções de iluminação que permitam conjugar iluminação natural e artificial ou desligamento automático da iluminação e sombreamento de aparelhos de ar condicionado de janela. Hoje, há dez edifícios etiquetados no Brasil e mais aproximadamente 50 em processo de concessão da etiqueta. Prédios novos e existentes, desde que tenham os projetos completos, podem ser etiquetados.

Solange Nogueira, engenheira civil gerente da Divisão de Eficiência Energética em Edificações da Eletrobrás solangenogueira@eletrobras.com

Escopo de certificação


Há algumas certificações ambientais de empreendimentos disponíveis no Brasil, como LEED (Green Building), Aqua (Fundação Vanzolini), Selo Azul (Caixa Econômica Federal) e Procel Edifica. Essas certificações abrangem somente o projeto ou entram no mérito da obra e da operação do empreendimento? Essas certificações garantem um desempenho sustentável?

Rochaverá Corporate Towers: projeto do escritório Aflalo & Gasperini da incorporadora norte-americana Tishman Speyer

Três dessas certificações entram no mérito do projeto e da obra, mas não da operação; o Procel Edifica cobre apenas o projeto. Mas cabe esclarecer que elas avaliam as condições de projeto que vão permitir uma operação ambientalmente sustentável. Como é no projeto que se definem as características de empreendimento, o desempenho depende dele ao longo da vida útil. Por exemplo, a previsão de dispositivos que levem à redução do consumo de água é feita no projeto, mas as economias acontecerão na operação; mas sem os dispositivos, tal objetivo estaria sacrificado. É por isso que as certificações exigem a previsão desses dispositivos no projeto, cuja instalação efetiva é demonstrada após a execução da obra.

Daí a importância de avaliar também as condições da obra, seja para verificar se o que foi previsto no projeto de fato foi realizado, seja para tratar de temas diretamente relacionados à execução, como o uso racional dos recursos (materiais, água, energia), o gerenciamento de resíduos e a redução dos incômodos e das diferentes formas de poluição que um canteiro de obras pode causar, nos trabalhadores, na vizinhança e na comunidade como um todo. Algumas das certificações preveem a inclusão, no manual de operação que se entrega aos usuários e aos responsáveis pela operação, de informações precisas para que se tenha o uso e a operação sustentáveis. Além disso, um dos 14 temas cobertos pelo Processo Aqua volta-se especificamente à manutenção, estabelecendo critérios para que se tomem ações no projeto que assegurem a permanência do desempenho ambiental ao longo da operação.

Apesar disso, nenhuma dessas cerificações garante um desempenho sustentável; o que trazem são elementos que asseguram que o edifício possua condições técnicas e arquitetônicas para tal desempenho. Essa limitação vem de nenhuma delas poder reverter o fato de que o empreendedor não tem poder sobre o comportamento dos futuros usuários e responsáveis pela operação do edifício - embora se prevejam dispositivos, são eles quem vão fazer uso deles, que podem não respeitar as orientações passadas. Há, portanto, a necessidade de uma permanente educação da sociedade quanto ao tema: os usuários e os técnicos têm que mudar seu comportamento para que se tenha melhor desempenho dos edifícios em uso, sejam eles certificados ou não.

No entanto, o Leed e a certificação francesa na qual se apoia o Aqua possuem referenciais de certificação voltados para a etapa de operação, que devem em breve estar disponíveis no Brasil. Isso significa que, por exemplo, uma administradora condominial ou o responsável técnico pela operação de um edifício corporativo, de um shopping center ou de um hotel podem ter certificadas as suas práticas de gestão sob o ponto de vista ambiental. Além disso, na Escola Politécnica da USP finalizamos há pouco uma pesquisa de doutorado que propõe um modelo de gerenciamento da sustentabilidade de facilidades construídas que, embora não vise à certificação, traz elementos importantes visando ao uso, a operação e a manutenção de edifícios sustentáveis.

Francisco Ferreira Cardoso, engenheiro civil
Professor titular do Departamento de Engenharia de Construção Civil da Escola Politécnica da USP

Custos de certificação

Qual o custo médio, por metro quadrado, para certificação de edificações comerciais de alto padrão?

Processo AQUA

O valor total da certificação Processo AQUA pela Fundação Vanzolini, incluindo as auditorias presenciais, avaliações e emissões dos certificados, nas três fases - Programa, Concepção e Realização, para um edifício comercial padrão com cerca de 10.000 m2 construídos é de R$ 31.200,00, o que corresponde a R$ 3,12/m2. Como regra geral, o valor vai de R$ 17.500,00, para até 1.500 m2 construídos, a R$ 87.500,00, para 45.000 m2 ou mais metros quadrados construídos. A certificação AQUA para empreendimentos comerciais se baseia no atendimento a critérios de sustentabilidade coerentes e abrangentes, que compõem 14 categorias de desempenho agrupadas em quatro temas: ecoconstrução, ecogestão, conforto e saúde, cujo atendimento é verificado ao longo do empreendimento, no final das fases Programa, Concepção ou projeto, Realização e Operação/Uso.

Manuel Carlos Reis Martins, engenheiro civil
Coordenador-executivo da Certificação da Construção Sustentável - Processo Aqua e coordenador técnico na Certificação de Sistemas de Gestão Ambiental ISO 14.000 da Fundação Vanzolini

Procel Edifica

O custo médio estimado da avaliação do nível de eficiência energética de um projeto, feita por um organismo de inspeção acreditado pelo Inmetro e de acordo com a metodologia de etiquetagem de edifícios, é de R$ 15 mil a R$ 20 mil. Não é possível estipular um custo médio por metro quadrado (ver pergunta sobre a etiqueta Procel na página 36).


Solange Nogueira, engenheira civil
Gerente da Divisão de Eficiência Energética em Edificações da Eletrobras

Custos de obras



Qual o impacto da certificação ambiental nos custos da obra e nos custos de operação e manutenção do edifício?

Ainda é bastante prematuro falarmos no Brasil sobre o valor dos investimentos adicionais em um projeto/construção de uma edificação decorrentes da certificação LEED. Se avaliarmos as 18 certificações já obtidas no Brasil, verificamos que se tratam de diferentes tipos de empreendimentos com certificações LEED variadas. Normalmente um pequeno projeto tende a ter custos adicionais mais elevados, enquanto empreendimentos de grande porte conseguem diluir mais facilmente o investimento adicional. Alguns clientes, cujos projetos contaram com nossa consultoria efetuaram o levantamento desses custos, o que nos permite afirmar que para um retrofit completo de uma construção existente, o investimento adicional para a obtenção de uma certificação LEED for Core & Shell Ouro foi da ordem de 12%. Já numa nova construção de médio porte, que obteve uma certificação LEED NC, nível prata, esse investimento foi de 5%.

No mercado brasileiro, incorporadores importantes comprometidos com a certificação ambiental de edificações têm divulgado percentuais que oscilam entre 9% e 11% de investimento para que seus empreendimentos de grande porte sejam certificados. Essas são referências de casos reais, mas até que tenhamos mais certificações no País, não podemos garantir a consistência desses números, mesmo em projetos similares, visto que os requerimentos atendidos por um ou outro projeto podem variar consideravelmente. Algumas referências internacionais (EUA - que já possuem mais de dez anos de experiência com a certificação LEED) demonstram que os empreendimentos certificados apresentam (segundo dados da Mac Graw-Hill Construction, Key Trends in the European and U.S. Construction MarketPlace - SmartMarket Report, 2008) em média 8% a 9% de redução de seus custos operacionais, apresentam valorização do preço do empreendimento de aproximadamente 7,5% e 3% de aumento da taxa de locação entre outros indicadores de melhorias. Nos EUA os empreendimentos certificados muitas vezes contam inclusive com redução dos custos de seguros da edificação.

João Alves Pacheco, mestre em administração de empresas, diretor de Engenharia e Sustentabilidade da Cushman & Wakefield

Mais informações em:
http://www.revistatechne.com.br/engenharia-civil/162/artigo185839-1.asp?o=r

Meus comentários:

Parabenizo os autores dos conteúdos apresentados nesta edição de Téchne, assim como também a editora Pini pela ampla visão sobre os diversos aspectos do tema e por sua isenção diante deles. É de fato uma referência.

Acrescento: Sobre cursos e treinamentos para a Construção Sustentável e Certificações Ambientais de Empreendimentos:
http://www.ecobuilding.com.br/.

domingo, 3 de outubro de 2010

É chegada nossa hora?

Considerações para o desenvolvimento sustentável do Brasil
Por Antonio Macêdo Filho *

Tem se falado muito que o Brasil finalmente passará a ingressar, os próximos anos, no grupo dos países mais desenvolvidos do mundo. Há de fato uma série de indicadores favoráveis.

Preocupa-me, no entanto, o fato de que, para efetivamente entrarmos neste time de maneira definitiva e sólida, e permaneçamos lá, é preciso muito trabalho de muita gente bem preparada para lidar com os desafios desta missão. E aí está a questão fundamental, a meu ver: ainda não temos capital humano adequadamente formado para dar conta dos planejamentos, dos projetos, das execuções e operações que o conjunto de iniciativas necessárias para o desenvolvimento sustentável do país requer. E há muito que fazer.

O ambiente econômico difícil dos dois últimos anos nas maiores economias do mundo tem feito com que empresas dos mais diversos setores tenham dirigido seus vetores de crescimento para as nossas terras. Isto talvez favoreça a vinda de boas cabeças estrangeiras para atuar por aqui. Eu mesmo tenho tido contato com algumas delas, que estão buscando oportunidades de negócios no Brasil.

Mas não podemos depender disto. Temos que ter gente bem preparada aqui, falando (e bem) o português, e sabendo do que está falando. Não há mais tempo para improvisos e jeitinhos. Não me refiro apenas aos jogos de 2014 e 2016. Eles certamente darão forte impulso aos investimentos, mas precisamos de muito mais que isto para manter o fluxo, gerar e reproduzir as oportunidades e criar o desenvolvimento sustentável do país. Exemplifico:

A) Matriz energética

Unisa hidrelétrica de Itaipu, que até 2008 era a maior do mundo.

Hoje (2010), pouco mais de 80% da produção de energia elétrica brasileira é de fonte hidrelétrica, portanto, renovável (deixemos o tema do impacto das construções das usinas para outra discussão). Há 15 anos, era 95%. O que mudou, fundamentalmente, foi a entrada, a custo relativamente baixo para o consumidor final, do gás vindo da Bolívia. Ou seja, estamos trocando uma fonte renovável por outra não renovável, poluente, geradora de CO2 e ainda importada. Esta solução tem sido necessária para dar conta do crescimento da oferta, que tem que atender à demanda crescente. Considerando-se que o crescimento da demanda de energia tem elasticidade de aproximadamente 2 em relação ao crescimento do PIB, podemos esperar uma evolução entre 12 e 15% em 2010, em relação a 2009. Ou seja, temos que produzir mais, de qualquer jeito. Com isto, estamos olhando a questão apenas pelo lado da oferta.

A questão é: podemos obter importantes resultados otimizando o consumo (e em muitos casos, até reduzindo), aumentando a eficiência energética, do lado da demanda. Há diversas formas de fazê-lo. Seja estimulando a produção e implantação de sistemas de energias renováveis nas unidades de consumo final, especialmente solar e eólica, seja estimulando o consumidor a utilizar equipamentos de baixo consumo, informando as pessoas em todos os níveis a adotar melhores hábitos de consumo, seja promovendo regulamentações nas diferentes esferas de governo para promover a eficiência. Medidas assim podem conter a voracidade do crescimento do consumo de energia sem comprometer o desenvolvimento. Já deu certo em países como a Alemanha, Espanha e Japão. Em todos os casos, sem exceção, o que é necessário? Informação e formação técnica, além, naturalmente, da educação básica.

B) Energias renováveis

Parque eólico de Osório, no Rio Grande do Sul

Recentemente, os primeiros dois grandes leilões de energia eólica do país colocaram o Brasil no cenário mundial de energia a partir dos ventos. Dezenas de empresas conquistaram o direito de construir parques eólicos com contratos de venda da energia ao governo. Muito bom. Boa iniciativa. Espera-se que o sucesso destas primeiras estimule outras, inclusive também na área da energia solar, em especial a fotovoltaica, que de outra forma não se viabilizaria. Foi com estímulos que a tecnologia se desenvolveu em outros países. Certamente este será o caminho a ser seguido também por aqui.

A questão aqui é: quem vai projetar, implantar, operar e manter estas usinas de geração de energia eólica e solar? Para garantir que as oportunidades que se apresentem sejam de fato aproveitadas e possamos ter maior contribuição de fontes renováveis em nossa matriz energética, precisamos de gente muito bem preparada para dar conta do serviço. Temos? Ainda não. Temos recebido, isto sim, empresas estrangeiras, mais bem preparadas e com experiências bem sucedidas, especialmente no atlântico norte. O que é necessário? Informação e formação técnica, além, é claro, de inteligência para aprender com a experiência de quem sabe mais.

C) Infra-estrutura

Aeroporto Internacional de Guarulhos, o maior do país, hoje já saturado.

Para que o país possa dar vazão aos estímulos do crescimento, sem entraves, é preciso construir, e rapidamente, estrutura física adequada em diferentes setores: estradas, ferrovias, hidrovias, portos, aeroportos, metrôs, avenidas, viadutos, sistemas de telecomunicações e internet, estádios, residências e edifícios comerciais e industriais, tudo de maneira mais sustentável possível. É um desafio e tanto.

A questão, mais uma vez, é: temos gente qualificada em quantidade suficiente para dar conta do recado? Certamente ainda não. Temos que empreender um grande esforço na preparação de mão de obra e intelecto de alto nível para desenvolver estes projetos e obras. E aqui entra a questão do tempo. Não basta investir em formação técnica fundamental e de graduação. É preciso especialização. Rápida, eficiente e focada. Dirigida a aplicações de técnicas e tecnologias para acelerar a realização destas importantes obras. Ao governo cabe, a meu ver, estimular ações neste sentido, além de desregulamentar e desburocratizar a implantação destes projetos, deixando a iniciativa privada fazer o que sabe: empreender.

D) Construções Sustentáveis

No mundo todo, a construção é responsável por em torno de 30% das emissões de gases de efeito estufa e pela utilização de ¾ de todos os recursos naturais. No Brasil, a construção tem crescido a taxas superiores às do PIB e é responsável por algo em torno de 2 milhões de empregos formais diretos. Estes números devem crescer ainda mais nos próximos anos, ajudando em grande parte a estimular o crescimento do PIB do país. Os edifícios são ainda responsáveis por algo em torno de 45% do consumo de energia elétrica no Brasil, 20 % do consumo de água e suas construções por 2/3 da produção de resíduos sólidos urbanos. Estes números deixam claro, portanto, que estamos falando de uma atividade de alto impacto ambiental.

Eldorado Office Tower, primeiro certificado LEED platina da América Latina

Construções sustentáveis são aquelas que são projetadas, construídas e operadas de maneira a otimizar o uso de materiais, água e energia, bem como gerar menos resíduos e impactos ambientais, além de oferecer melhor qualidade dos espaços e do ar interior. Com isto melhoram o nível de conforto e de qualidade de vida, proporcionando maior eficiência e produtividade, além de valorização comercial e menor impacto ambiental. Ou seja, temos que fazer construções sustentáveis. O mundo todo está tentando fazer isto.

Para fazer edifícios sustentáveis, é preciso, necessariamente, partir de um processo de projeto integrado. Todos os envolvidos, não apenas projetistas, mas também proprietários, usuários, administradores, construtores, fornecedores, devem estar comprometidos em buscar os melhores resultados.

Em se tratando de projeto, não é mais possível seguir o processo tradicional, unidirecional, que parte do arquiteto, vai para o estruturalista, para o projetista de instalações, ar condicionado, etc. É preciso que todos trabalhem juntos, em um processo de alimentação mútua contínuo. Para isto, é fundamental melhor capacitação técnica de todos, não só para que entendam em que condições cada um pode melhor colaborar para o melhor desempenho do edifício como um todo, como até mesmo para conseguir desenvolver projetos que podem requerer detalhamentos profundos e simulações computacionais de desempenho.

E) Certificações ambientais e etiquetagem de edificações

Certificações ambientais podem ser obtidas por construções sustentáveis para garantir e atestar que tais edificações de fato possam ser assim consideradas. São promovidas por entidades acreditadas nacionais e internacionais e requerem o atendimento por estas edificações a um conjunto de requisitos e recomendações muitas vezes extenso e detalhado, para que possam ser certificadas.

No Brasil as certificações mais utilizadas são o LEED - Leadership in Energy and Environmental Design, promovida pelo US Green Building Council e o Processo AQUA, desenvolvido a partir do modelo francês HQE – Haute Qualité Environnementale, pela Fundação Vanzolini, que a promove no Brasil. Há ainda o programa brasileiro de etiquetagem de edificações Procel Edifica, da Eletrobrás / Procel, que avalia o desempenho energético de novas construções.

Etiqueta Procel Edifica

A adesão a quaisquer destas certificações é voluntária e os primeiros edifícios certificados do país confirmaram a expectativa e se tornaram sucesso comercial. Alguns estão inclusive buscando obter recursos com a venda de créditos de carbono, algo que ainda é recente, mas certamente irá crescer muito em todo o mundo.

O que se observa agora, no entanto, é que está faltando mão de obra técnica habilitada a lidar com as certificações, para assessorar os projetistas e construtores neste processo, em todo o país. Posso apenas imaginar como será quando o Procel Edifica vier a se tornar obrigatório - como já ocorreu em outros países e também no Brasil em outros setores, como o de eletrodomésticos - e todos os arquitetos tiverem que saber, ainda em projeto, quanto o edifício que estiver projetando consumirá de energia, em kWh / m2 / mês, quando construído e em operação. Quantos podem dizer que sabem fazer esta conta?

Precisamos de muitos mais LEED AP´s, Auditores AQUA e profissionais preparados para utilizar bem o Procel Edifica e para lidar com as demais questões relacionadas à construção sustentável. O que é necessário? Uma vez mais: formação, atualização e capacitação profissional.

Este, acredito, é um dos maiores desafios ao desenvolvimento sustentável do país.


Prof. Arq. Antonio Macêdo Filho*

* Arquiteto, Master em Arquitetura Bioclimática e Edifícios Inteligentes pela Universidade Politécnica de Madrid
Diretor do curso de Arquitetura e Urbanismo da UNICID – Universidade Cidade de São Paulo
Coordenador dos Programas de Pós-graduação Lato Sensu UNICID / InBec, dentre os quais o MBA em Construções Sustentáveis, oferecido em convênio com o Green Building Council Brasil
Diretor do EcoBuilding – portal de Arquitetura e Construção Sustentável