terça-feira, 17 de março de 2009

A Etiqueta Procel é posta em prática

Reproduzo a seguir matéria a respeito do programa brasileiro de etiquetagem de edificações. Publicado em 2008, fruto do trabalho de diversos pesquisadores, entre os quais destaco o prof. Roberto Lamberts, da UFSC, o programa Etiqueta Procel começa a ser posto em prática pelo mercado.

Iniciativa de fundamental importância para a evolução da qualidade das futuras edificações brasileiras, é ainda de adesão voluntária, mas será obrigatório. E isto causará impactos. Comento um pouco sobre minhas impressões a respeito das implicações do programa em uma próxima postagem. Por enquanto, acompanhem a matéria.

Etiquetagem avança

Ainda pouco conhecido do setor, Selo Procel Edifica deve certificar o primeiro edifício neste ano e se tornar obrigatório em 2012
Por Gisele C. Cichinelli, para Construção Mercado (Ed. Pini), publicado em PiniWeb

A exemplo do que já ocorre com eletrodomésticos, o Selo Procel Edifica irá certificar projetos que preveem redução de consumo e uso de energias alternativas, estimulando a adoção de ações nesse sentido. A etiquetagem das edificações comerciais, públicas e residenciais opera, desde 2007, em caráter provisório, mas, a partir de 2012, passará a vigorar como lei. O primeiro prédio deverá ser certificado neste ano, na forma de um estudo piloto.

O objetivo do Selo é estimular os construtores e incorporadores a aderirem aos conceitos de eficiência energética em edificações, viabilizando a implementação da Lei 10.295/01 ("Lei de Eficiência Energética"). Mesmo ante a resistência do setor frente à adoção de soluções e práticas ecoeficientes, especialistas se mostram otimistas em relação ao programa de etiquetagem. "Qualquer iniciativa que induza o mercado a reduzir o consumo de energia elétrica é benéfica", opina Luiz Henrique Ceotto, diretor de construção e projetos da Tishman Speyer do Brasil.

Ainda são raras as incorporadoras que se preocupam com o nível de eficiência energética de seus empreendimentos. Mas, segundo o engenheiro civil Fernando Westphal, gerente de eficiência energética da unidade de sustentabilidade do CTE (Centro de Tecnologia de Edificações), o selo será um forte instrumento de mudança no mercado. "Hoje, quem se atenta para essa questão não consegue mostrar ao consumidor final o diferencial do seu projeto", ressalta. Para ele, o selo agregará valor às edificações, dando oportunidade para que esses empreendimentos se diferenciem dos convencionais.

Entre os itens a serem avaliados pelo programa estão o sistema de iluminação, o sistema de condicionamento de ar e a envoltória. Para cada um deles, já existem pré-requisitos e recomendações para alcançar as classificações que vão de "A" a "E", dependendo do nível de eficiência energética da edificação. "Para cada item, será atribuído um peso. A média ponderada das três etiquetas irá determinar a classificação final do prédio", observa Westphal.

Para manter a liberdade do projetista, a lei considera também a opção de análise de conformidade por meio de simulação computacional. Neste caso, o projeto não precisa seguir os itens prescritivos da lei, desde que seja comprovado, por meio de simulação térmica e energética, que a solução proposta apresenta eficiência maior ou igual à norma. "Espero que isso coloque de vez a prática de simulação computacional como uma ferramenta usual de projeto", espera o engenheiro do CTE.

De fato, a implementação da etiqueta deve trazer impactos à maneira brasileira de projetar. Além de exigir maior integração entre os projetistas, práticas já consagradas como o uso de fachadas envidraçadas, isolamento térmico em paredes e vidros duplos deverão ser questionadas. "Será que é possível fazer um prédio eficiente com cortina de vidro no Brasil? Será que o vidro duplo resolve o problema nesse caso? E será que não precisaríamos utilizar mais isolante térmico em paredes? Estamos tentando responder a questões como essas por meio de simulação computacional. Não há uma resposta genérica, e nem deve haver. Cada caso é um caso. Mas nossos projetistas não estão acostumados a esse tipo de análise. Isso vai mudar", enfatiza Westphal.

Investimento compensa

Na opinião de Ceotto, o prazo de cinco anos para que o selo seja implementado em caráter obrigatório é suficiente para as empresas se adaptarem às novas exigências. Sobretudo porque as tecnologias que proporcionam redução de consumo já estão disponíveis no mercado. Mas o diretor ressalta que, para lançar mão delas, o incorporador ou construtor terá de desembolsar de 5% a 7% a mais no custo de construção de edificações comerciais e residenciais, respectivamente. A economia gerada, no entanto, chega a até 40%, "pagando" o investimento em apenas três anos. "Estamos sensibilizando o investidor em relação a essa questão. Eles devem entender que é como se estivessem investindo em um seguro contra a obsolescência da edificação", acrescenta.

Roberto Wagner Lima Pereira, consultor do Ministério de Minas e Energia, lembra que o fato de o conceito de construções verdes já estar incorporado em diversos segmentos da construção civil deve facilitar a adaptação do mercado às novas diretrizes. Mas, para Westphal, a falta de divulgação do projeto pode ser um dos entraves para que a lei 10.295 pegue. "As edificações deveriam receber atenção especial. Tenho a impressão de que, no Brasil, como a geração de energia é quase toda renovável (hidrelétricas), não há uma preocupação com eficiência energética, como nos Estados Unidos e Europa, por exemplo", alerta.

Apenas na cidade de São Paulo, mais de 1,2 mil edificações estão em construção. Diante desse dado, cabe perguntar: qual será a estrutura necessária para analisar todos esses projetos e obras? Westphal sai na frente e avisa que faltam laboratórios credenciados para realizar a certificação "Alguns clientes querem buscar a etiqueta, mas não temos a quem submeter os projetos", alerta. Enquanto os laboratórios são preparados para avaliarem os projetos, o primeiro prédio deverá ser certificado ainda em 2009, na forma de um estudo piloto.

Em relação às edificações residenciais, Solange Nogueira Puente Santos, gerente da divisão de projetos de eficiência energética em edificações do Procel/Eletrobrás, lembra que a regulamentação para etiquetagem do nível de eficiência energética ainda está sendo elaborada. Com tipologias variadas e pouco uso de condicionamento de ar, a regulamentação irá avaliar o nível de conforto térmico proporcionado por um determinado projeto. Para isso, a simulação de desempenho térmico será fundamental.
Os projetos poderão ser avaliados antes da execução das obras, permitindo a identificação de itens críticos que coloquem em risco o conforto térmico no ambiente construído. Já a fiscalização será feita de acordo com os projetos certificados. "Primeiro, certifica-se o projeto; em seguida, a obra pronta", explica Westphal.

Consumo em números

As edificações representam quase metade do consumo de energia do País. Segundo informações do Ministério de Minas e Energia, elas são responsáveis por 42% de toda a energia elétrica consumida. O setor residencial contribui com 23%, o comercial, com 11% e o público, com 8% desse percentual. Um dos grandes vilões, nesses dois últimos setores, é o sistema de condicionamento de ar, com 48% do consumo de energia elétrica, seguido pelo sistema de iluminação, com 24%.

Com a concessão da etiqueta, e posteriormente do selo, o Ministério de Minas e Energia acredita que será possível nortear parâmetros para construções mais eficientes, estimulando o mercado a adotar as melhores práticas no que se refere à economia de energia. "Ações como essas têm como objetivo postergar investimentos em novos projetos de geração de energia economizando divisas para o País e minimizando os impactos negativos ao meio ambiente", ressalta Roberto Wagner Lima Pereira, consultor do Ministério de Minas e Energia.

Enquanto o consultor rechaça o risco de um novo apagão no País, especialistas alertam sobre a possibilidade de um novo colapso energético. Basta uma rápida olhada na curva de crescimento da economia brasileira para ter algumas pistas do que poderá acontecer. Nos últimos 20 anos, o aumento do consumo de energia tem sido muito maior do que o aumento do PIB. "Isso significa que o País, como um todo, não é eficiente", lembra Fernando Westphal, do CTE. "Sempre que se fala em projeção de aumento no PIB, há um alerta para uma provável crise de abastecimento de energia. Para crescer de maneira eficaz, temos que mudar nossos padrões de eficiência e esse assunto deveria receber mais atenção do governo e da mídia", acrescenta.

Etiquetagem passo-a-passo

O processo de etiquetagem baseia-se na avaliação da edificação em duas fases, de projeto e construída. Confira os principais passos.

Nível de eficiência
O requerente deverá apresentar o projeto e autodeclarar, por meio de um memorial de cálculo e diversas comprovações, o respectivo nível de eficiência energética da sua edificação a um laboratório acreditado pelo Inmetro.

Análise
Após a conferência dos dados, o laboratório valida ou não o nível autodeclarado. É facultado ao laboratório reiniciar o processo, desde que toda a documentação seja reapresentada com as devidas alterações para ser submetida à nova análise.

Etiqueta
A última fase é a avaliação da edificação construída. Através de uma conferência por amostragem, verifica-se se a obra foi executada de acordo com as premissas do projeto, que servem de base para a avaliação. A conferência é da obra pronta e a etiqueta é datada.

Fonte: Procel/Eletrobrás
Publicado em PiniWeb, em março de 2009

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